Transições, mudanças, abandonos e objetivos

Mudanças nunca são fáceis, nem se é só mudança pro apartamento do lado. Mudanças são também internas: escolher o que vai e o que fica pra trás. Aceitar que as coisas vão ser diferentes, que a rotina vai mudar, pra pior ou pra melhor. Eu me mudei poucas vezes até hoje. De Canoas pra Porto Alegre, temporariamente pra Canoas e depois pra Lisboa. Por motivos que não valem a pena discutir aqui, na segunda vez que morei em Canoas eu dormi no escritório do apartamento do meu irmão por 2 meses. As malas prontas me lembravam todos os dias de que aquela situação era temporária, eu só precisava ter paciência. Quando chegamos em Lisboa ficamos 15 dias morando em um AirBnB até achar um lugar pra alugar. Eu demorei uns meses pra me sentir em casa, o que é estranho, pois Portugal parece muito com o Brasil, só que completamente diferente. A língua parece Português Brasileiro, mas mais complicado, às vezes indecifrável. As coisas funcionam parecido com o Brasil, mas também totalmente diferentes. A sensação é de viver em uma versão perversa do Vale da Estranheza. Parecido o suficiente com o Brasil pra me fazer sentir que não saí de lá, mas diferentes o suficiente para me fazer sentir saudade de casa, com a desvantagem de estar longe da família e dos amigos. Não é ruim morar aqui, não me entendam mal. Apesar dos idosos agressivos, da sujeira na rua e da falta de xis, é um país seguro e relativamente barato. Provavelmente o meu maior problema seja que Portugal me lembre demais daquele período transitório. Nosso plano nunca foi vir pra cá, mas viemos quando tivemos a oportunidade pois nos parecia uma maneira de "entrar na Europa" e depois ir pra outro lugar. Eu não sei se essa sensação de não-pertencimento é culpa minha, por estar sempre pensando "quando eu for pra outro país" ou se é culpa dessa proximidade estranha entre os países. Talvez se tivéssemos ido para um país com uma língua e costumes bem diferentes o choque cultural e a adaptação abrupta disparassem a sensação de que estamos, com toda certeza, em outro país.
A primeira vez que vim para cá foi em 2014, e desde então se tornou o meu plano retornar e morar aqui. 10 anos atrás eu comecei a imaginar como seria vir pra cá. 2020 chegamos em Portugal, e desde então a sensação é de que ainda estou esperando pela grande mudança. Portugal se tornou o escritório em Canoas, mas ao invés de esperar por 2 meses já se passaram 4 anos (2 deles roubados pela pandemia).
Isso vai soar dramático, mas eu não sei se vou conseguir ser feliz em algum lugar, e a culpa é só minha. Se um dia eu finalmente conseguir ir pra Finlândia, que é o lugar que colocou em movimento essa saga maluca, será que vou mesmo me sentir em casa, como me senti 10 anos atrás? Essa admiração resistiria ao primeiro inverno de baixas temperaturas e pouco luz solar? Será que minha família vai se sentir em casa, depois de 10 anos me ouvindo falar sobre este país que alguns dizem que nem existe?
Voltar pra casa não é uma opção. Eu me sentiria muito fracassado. Pior do que isso: eu provavelmente não me sentiria em casa. O Brasil não é mais o mesmo, as pessoas não são mais as mesmas, Porto Alegre não é mais a mesma (literalmente, depois da enchente mais recente).
Talvez eu devesse ter ficado em casa e aceitado que Porto Alegre era meu lugar.
Ignorância é uma benção e eu não sei como resolver isso.



“I must change my life so that I can live it, not wait for it.” ― Susan Sontag

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